O tema foi o futuro do produtor de pequeno porte
No último dia 4 de maio, durante a 24ª Feira Internacional de Tecnologia Agrícola em Ação (Agrishow), em Ribeirão Preto, foi realizado o debate ‘Qual o futuro dos produtores rurais de menor porte econômico?’. O evento faz parte do Seminário ‘Agenda do Agronegócio – Agricultura do Futuro’ sendo organizado pela empresa Oceano Azul e a Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo. Contando com a participação de Zander Navarro, pesquisador da Embrapa em Sociologia Rural; Alysson Paolinelli, ex-ministro da Agricultura e presidente da Associação Brasileira de Produtores de Milho (Abramilho); João Brunelli Júnior, titular da Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (Cati) da Secretaria; e Isaac Leite, presidente da Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar do Estado de São Paulo (Fetaesp), os presentes puderam refletir sobre as perspectivas do cenário da categoria.
Todos os debatentes concordam, seja na visão dos especialistas da pesquisa, do setor público, ou dos representantes do segmento produtivo, que os desafios para responder a pergunta são enormes. Porém, ressaltam que a organização em grupos, cooperativas e associações, além do acompanhamento das novas tecnologias disponíveis para o setor agropecuário são medidas essenciais para que o pequeno produtor e o agricultor familiar possam obter maior produtividade e adaptar-se às exigências do mercado nacional e mundial.
Segundo os debatedores, além do associativismo/cooperativismo, para maior dimensão da produção da categoria; a profissionalização, com práticas produtivas mais racionais para ampliação da qualidade dos alimentos produzidos; e, um maior investimento em tecnologia, para a redução dos custos de produção são fundamentais para a garantia de um futuro próspero para os pequenos produtores brasileiros.
Números
Brunelli abriu o painel demonstrando as atividades e atuações da Cati. Destacou que há 1.145 cooperativas e associações no Estado, onde a instituição realiza ações e projetos de apoio às entidades e, com auxílio do Instituto de Cooperativismo e Associativismo (ICA), proporciona suporte para que novas organizações de produtores rurais se constituam. Trouxe números, “em 2016, auxiliamos o produtor na emissão de 29.500 Declarações de Aptidão ao Pronaf (DAPs), ou seja, mais de 70% dos documentos emitidos no Estado. Em 2015, foram emitidas 11.900 Declarações de Aptidão ao Feap (DAF) e na elaboração de 27.900 projetos de crédito. Nosso trabalho é fazer com que o produtor tenha acesso a políticas públicas como de máquinas e implementos comunitários e apoio a pequenas agroindústrias”, disse.
Além de destacar o Projeto de Desenvolvimento Rural Sustentável – Microbacias II – Acesso ao Mercado como foco de financiamento das iniciativas de negócio voltadas ao mercado. “O apoio é mais no sentido de levar a informação e acesso dos produtores ao mercado do que na produção”, avaliou Brunelli, ressaltando que a agregação de valor ao produto é o caminho para atingir novos mercados.
Brunelli apresentou ainda um possível manual de sobrevivência do pequeno produtor rural em um mercado que está cada vez competitivo, com sugestões à adoção para o agricultor familiar conseguir entra e “permanecer no mercado em um ambiente altamente concorrido, especialmente como o de São Paulo”, afirmou.
Homem do campo
Para Isaac Leite, a adoção de tecnologias modernas e a diversificação com produtos de maior valor agregado, mais próximos à necessidade do consumidor e a profissionalização dos trabalhadores são ações primordiais para que o pequeno produtor prospere.
Destacando que a agricultura familiar é responsável por 70% do abastecimento da mesa dos brasileiros, ele afirmou que o setor tem conquistado um espaço maior, principalmente com a agroecologia e a produção de orgânicos, sendo hoje uma categoria importante na geração de empregos. “Sou agricultor desde pequeno, já vi muitas inovações e, temos que acompanhar a evolução tecnológica para nos fortalecer e ter resultados. Hoje mesmo vi aqui na Agrishow a apresentação de um trator sem cabine, o que pode ser um fator de perda de posto de trabalho, mas também uma possibilidade de avanço para a produção”, ressaltou.
Leite trouxe ainda um pouco da história da Fetaesp e salientou as ações que a entidade promoveu ao longo dos anos, dando ênfase a luta pelos direitos da categoria.
Concorrência no campo
Para o pesquisador Zander Navarro, nunca houve um período tão ameaçador para a agricultura familiar, como atualmente. Ele destaca que já em 2006, apesar da existência de cinco milhões de estabelecimentos rurais no Brasil, apenas cinco mil eram responsáveis por 87% da riqueza do país, número que hoje é ainda maior devido a iminência de o Brasil se tornar o maior produtor mundial de alimentos, assim o “bolo de riqueza passou a ser cada vez mais disputado por gente muito forte”, alerta.
Navarro ressalta a necessidade da troca de nomenclatura e segmentação entre o agronegócio e a agricultura familiar, já que mesmo um grande conglomerado pode ser gerido de forma familiar. Destacou que “os americanos veem agricultura como negócio. No Brasil deveríamos terminar com segmentação de familiar e agro e olharmos o mundo rural e seus problemas, buscando um planejamento que considere a heterogeneidade do País”, ponderou.
E defendeu o uso da pressão política por parte dos pequenos produtores como forma de defesa de seus direitos. “Agir politicamente é algo que se espera em um regime democrático […] Se os agricultores não se organizam, não pressionam, nada vai cair do céu, porque os recursos não existem para todos. Sendo assim, para onde eles vão? Para quem pressiona mais”, concluiu.
Mudança de hábitos
A evolução também foi destaque na opinião do ex-ministro da Agricultura no governo Geisel (1974-1979), Allysson Paolinelli. Ele relembrou os tempos de governo, “Na década de 1960, o brasileiro consumia quase a metade de sua renda familiar em alimentação, algo que atualmente ocorre em Bangladesh, que não tem capacidade de produzir. Como modificamos isso no Brasil? Com a capacidade inovadora, ciência, tecnologia e inovações para criar uma agricultura tropical que estarrece o mundo. Produzimos alimentos mais baratos, de melhor qualidade e com preços competitivos”, afirmou.
Para Paolinelli, a agricultura brasileira se diferencia das demais por ser altamente sustentável, mas que precisa ser melhor difundida no mundo, “Nossa agricultura sustentável garantirá segurança alimentar. O mundo busca alimentos mais saudáveis e o pequeno agricultor é capaz de gerenciar, administrar e ter tecnologia, irá se beneficiar do mercado de orgânicos. Precisamos apenas de lideranças e vontade política”, avaliou.
Agrônomo, e atual presidente da Abramilho, ressaltou que já é possível perceber uma mudança nos hábitos alimentares mundiais, sobretudo nos países de 1º Mundo, em direção aos produtos orgânicos, criados de maneira sustentável. Assim, segundo ele, é uma boa oportunidade de negócios para os pequenos produtores rurais: “Os países ricos estão criando um mercado cada vez maior para os alimentos saudáveis. Não podemos perder isso. Temos de ser inteligentes”, disse.
Paolinelli por diversas vezes fez menções a fala do presidente da Fetaesp, ressaltando a importância da presença de um representante dos trabalhadores do setor na mesa de debates. Também parabenizou Leite pela visão da implementação das tecnologias na produção e propriedades dos agricultores familiares, como forma de ampliação da renda e aumento de produtividade.